Palavra Profética

O Exílio de Judá na Babilônia - de Josias até Zedequias - Pr. Carlos Sant'Anna

O Exílio de Judá na Babilônia - de Josias até Zedequias - Pr. Carlos Sant'Anna
Neste estudo, o pastor Carlos R. Sant'Anna, teólogo, escritor, faz um estudo histórico e cronológico dos principais fatos correlatos de um período muito curto de 23 anos, que inicia logo após a morte de Josias, o último dos reis justos.

            Conforme 2 Reis 22.1-2, Josias tinha oito anos de idade quando começou a reinar e reinou trinta e um anos em Jerusalém, ele fez o que era reto aos olhos do Senhor e é considerado o último dos reis justos de Judá. Seu reinado vai de 640 aC a 609 aC e precede Amon, seu pai, o qual foi um dos mais impiedosos reis em Judá. Sua atividade, no intuito de restaurar o templo, renovar o pacto do Senhor, celebrar a páscoa, não são suficientes, para Deus demover o ardor de sua ira contra Judá (2 Reis 23.26).

            O nível de pecado, idolatria, injustiças, imoralidades, haviam alcançado patamares inimagináveis e era certa e chegada a hora de Deus tratar a nação de Judá. Em 609 aC, o Faraó Neco do Egito, empreendeu em conjunto com seus aliados, os Assírios, uma luta contra o novo império Babilônico que se ascendia. O Faraó Neco levou suas tropas a Carquêmis, o que o faz passar por terras controladas por Judá e leva Josias, sem consultar a Deus sair em guerra contra Neco, o que termina em derrota e a morte de Josias em combate (2 Reis 23.29-30; Cr 35.20-23).

            No lugar de Josias passa a reinar Joacaz com 23 anos de idade, tendo reinado apenas 3 meses sobre Jerusalém (2 Reis 23.31; 2 Crônicas 36.1). Ele é considerado como rei mau, impiedoso (2 Reis 23.32), e no mesmo ano, Faraó Neco o depõe, o prende em Hibla, terra de Hamate e impõe a Judá o tributo de cem talentos de prata e um talento de ouro (2 Reis 23.33; 2 Crônicas 36.3). Faraó Neco pôs a Eliaquim, irmão de Joacaz, rei sobre Judá e Jerusalém e muda o seu nome para Jeoaquim, levando definitivamente Joacaz para o Egito onde morre (2 Reis 23.34; 2 Crônicas 36.4).

            Jeoaquim tinha vinte e cinco anos de idade quando começou a reinar (608 aC), ficando por 11 anos no trono, sendo que fez o que era mau aos olhos de Deus (2 Reis 23.36,37; 2 Crônicas 36.5). Daniel relata que no ano terceiro do reinado de Jeoaquim, Nabucodonossor vem da Babilônia e sitia Jerusalém (Daniel 1.1) e este fato é relatado também pelo profeta Jeremias, o qual informa que o fato ocorre no quarto ano de Jeoaquim, filho de Josias (Jeremias 46.2). Dado a pequena diferença de tempo, podemos situar a chegada de Nabucodonossor entre o fim do terceiro e o início do quarto ano do reinado de Jeoaquim, o que nos coloca no ano de 605 a.C “Em 605 a.C., Nabucodonosor, ainda como príncipe herdeiro, derrota o Faraó Neco II na Batalha de Carquemis. Isso marcou o fim da presença egípcia na região do corredor Siro-Israelita e do que restava do Império Assírio1. Daniel informa que Nabucodonossor levou utensílios da casa do Senhor, além de jovens de linhagem real e dos nobres (Daniel 1.2-3). Neste ponto e na sucessão de Jeoaquim por seu filho é necessária uma análise exegética muito minuciosa entre 2 Reis 24.8-17 e 2 Crônicas 36.9-10.  No texto de 2 Reis, é informado que Joaquim, filho de Jeoaquim, tinha dezoito anos de idade quando começou a reinar e reinou três meses, quando então subirão os servos de Nabucodonossor e a cidade foi cercada. É informado que também veio Nabucodonossor, o qual levou preso Joaquim, sua mãe, seus, servos, príncipes, eunucos, fato que ocorreu no oitavo ano de seu reinado, é narrado ainda que Nabucodonossor transportou dez mil presos, além de levar todos os tesouros da Casa do Senhor e os tesouros da casa do rei, e fendeu todos os utensílios de ouro que Salomão fizera. Já na narrativa de 2 Crônicas, é afirmado que Joaquim era da idade de oito anos quando começou a reinar e 3 meses e 10 dias reinou em Jerusalém e no decurso de 1 ano, Nabucodonossor mandou que o levassem à Babilônia, como também os mais preciosos utensílios da Casa do Senhor. A aparente divergência com a idade apresentada em 2 Reis de 18 anos e 2 Crônicas de 8 anos para a idade do governante quando iniciou a reinar será analisada exegeticamente abaixo:

 

2 Reis 24.8

            Acima, transliteramos por “Ben – Shemoneh Yesereh Shanah Ieoiakin”, é traduzido por Jeoiaquim (Joaquim) iniciou seu reino com 18 anos (Shemneh+’esereh è 8 + 10 = 18).

  • Shemneh è oito
  • ‘esereh è dez
  • Shana è anos

 

2 Crônicas 36.9

            Acima, transliteramos por “Ben – Shemoneh Shanim Iehoiakin”, o qual é traduzido por Jeoiaquim (Joaquim) iniciou seu reino com oito anos .

  • Shemoneh è oito
  • Shanim è anos

            Uma vertente de estudiosos entende como um “erro de escriba”, sendo que no texto de 2 Crônicas poderia ter havido a supressão da palavra “‘esereh” - dez, o que é plausível diante da ciência da Crítica Textual. A Sociedade Bíblica do Brasil, adotou nas traduções: Nova Tradução da Linguagem de Hoje – NTLH, Nova Almeida Atualiza – NAA e Almeida Revista e Atualizada – ARA, em seu texto “18 anos”, o que é divergente quanto ao texto original e aceitável apenas na tradução NTLH o qual adota a equivalência dinâmica ou funcional. Esta tradução errônea é condenável nas demais traduções pois altera o texto original.  Na tradução “Almeida Corrigida e Revista”, a Sociedade Bíblica manteve o texto original. Devemos entender que deve ser tarefa da teologia hermenêutica e exegética buscar a resposta, e considero condenável a mudança do texto original, ainda que feito nos níveis mais elevados de acadêmicos, pois podemos cair na mesma relativização dos originais o qual temos visto na chamada teologia liberal. Retornando ao texto original e a divergência apresentada, apresenta-se aqui uma hermenêutica com base em uma análise literal do escrito. Parte-se da premissa que o texto original está bem escrito e que textualmente temos realmente uma divergência de anos que é explicada na hermenêutica dos textos, no estudo de outros textos e na harmonização histórico cronológica, vejamos:

 

  • Em 2 Crônicas 36.9, o cronista tinha em vista a data inicial de quando Joaquim (Jeoiakim filho) foi considerado Rei, com oito anos, uma criança ainda, debaixo do reinado de seu pai Jeoaquim. O fato do rei-Pai identificar entre seus filhos no harém real àquele que iria assumir o trono quando da morte ou impossibilidade de o pai reinar, foi comum na antiguidade. Veja por exemplo o caso de Salomão, que desde o nascimento fora escolhido por Deus para ser o próximo rei de Israel, o que era de pleno conhecimento de Davi o rei-pai. Deve-se entender que o resto da narrativa fala de período futuro, quando já com 18 anos recebe oficialmente a coroa. Devemos lembrar que as narrativas bíblicas são dinâmicas, o escritor, observador não precisa em sua visão estar preso a uma narrativa ordenada em termos de tempo ou simplesmente comete um anacronismo.
  • Em 2 Reis 24.8, o autor tem em vista Joaquim (Jeoiakim filho) com 18 anos, assumindo definitivamente, como rei soberano o trono, que estava vazio em decorrência da morte de seu pai (2 Reis 24.5).

 

            Conforme a figura abaixo, temos uma visão cronológica da explicação acima.

 

 

            No livro de Daniel 1.1, é informado que no terceiro ano do reinado de Jeoaquim, rei de Judá, veio Nabucodonossor, rei da Babilônia, a Jerusalém e a sitiou. O Senhor entregou a Nabucodonossor: Jeoaquim, a cidade, além de uma parte dos utensílios da Casa de Deus. É neste período que Daniel e seus amigos Hananías, Misael e Azarias também são levados cativos.

            Jeoaquim iniciou seu reinado em 609 aC, se considerarmos os 3 anos citados chegamos no final de 606 aC e início de 605 aC, data no qual Nabucodonossor sitia Jerusalém. No livro de 2 Crônicas 36.5-8, temos a informação que Jeoaquim governou por 11 anos e que ele foi preso com correntes por Nabucodonossor que o levou para a Babilônia. 2 Reis 24.1, diz que durante três anos Jeoaquim foi dominado por Nabucodonossor, mas depois se revoltou. Com base em Daniel, 2 Crônicas e 2 Reis, sabemos que 3 anos após o início do reinado de Jeoaquim, Nabucodonossor sitia e toma Jerusalém (605 d.C.) e que após 3 anos de domínio Jeoaquim se revolta o que culmina na sua deportação para Babilônia (aproximadamente em 602-601 aC) e morte em 597 a.C.  Jeremias descreve a presunção de Jeoaquim, que veio a perseguir e matar servos de Deus (Jeremias 26:20-23), além de profetizar a própria destruição de Jeoaquim visto sua resistência em se arrepender (Jeremias 36). É interessante que a narrativa de Jeremias em 36.1, inicia falando de Jeoaquim, filho de Josias e após as imprecações proféticas do capítulo 36, inicia em 37.1 dizendo que “O Rei Nabucodonossor, da Babilônia, pôs Zedequias, filho de Josias, como rei na terra de Judá, no lugar de Joaquim, filho de Jeoaquim. ” Com todo este contexto bíblico, podemos concluir que:

 

  • Jeoaquim assume o reino de Judá em 609 aC e reina por 11 anos;
  • Em 608 aC, Joaquim seu filho é tido como herdeiro sucessor;
  • Em 605 aC, Nabucodonossor sitia Jerusalém (Jeremias cita este ano como o primeiro ano do reinado de Nabucodonossor como rei da Babilônia), tomando parte dos objetos do templo e permitindo a co-regência de Jeoaquim;
  • 2 Reis 24.1 declara que durante o reinado de Jeoaquim, o rei Nabucodonossor invade Judá e 3 anos mais tarde, Jeoaquim se revolta e acaba por ser enviado preso em cadeias para a Babilônia, onde irá morrer em 597 aC;
  • Os prisioneiros separados da família real e dos nobres, dentre eles Daniel e seus amigos podem ter sidos deportados neste período ou logo em 605 a.C
  • Joaquim que já era tido como rei e foi colocado no trono provavelmente por Nabucodonossor, ainda jovem.
  • Certamente, por sua jovialidade (11-12 anos), Joaquim, tendo seu pai no exilio a maior parte de seu governo, teve como referencial de governo a Jeoaquim o qual era considerado rei em vida e teve influência sobre a corte que havia sido deixada por Nabucodonossor;
  • Em 597 aC, Joaquim, com a morte do pai no exílio, já acompanhando está co-regência, governa “oficialmente”, do ponto de vista da lei judaica, por três meses e dez dias em Jerusalém, dando continuidade aos atos malignos de seu pai o qual tem como consequência Nabucodonossor vindo a sitiar novamente a cidade de Jerusalém.
  • 2 Reis 24.12 informa que no oitavo ano do reinado de Nabucodonossor (597 aC), Joaquim foi levado como prisioneiro para a Babilônia, além de sua mãe, esposas, oficiais, artesãos, ferreiros, 10 mil ao todo.
  • Nabucodonossor coloca Matanias, tio de Joaquim como rei de Judá e muda seu nome para Zedequias (2 Reis 24.17)

            Zedequias tem o início de seu governo em 597 aC e vai até 587-586 aC, quando temos a total destruição de Jerusalém e a última deportação dos judeus para a Babilônia e o qual somente terá fim quando do edito de Ciro. O governo de Zedequias é um caso particular e mostra o grande embate do profeta Jeremias contra um sistema governamental decaído moralmente, maligno, injusto e o qual sua profecia pede a total rendição do povo ao governante estrangeiro.

 


1 Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Carquemis